A Última Ceia
Quando chegou a hora, Jesus e os seus apóstolos reclinaram-se à mesa. E disse-lhes: "Desejei ansiosamente comer esta Páscoa com vocês antes de sofrer. Pois eu lhes digo: Não comerei dela novamente até que se cumpra no Reino de Deus". Recebendo um cálice, ele deu graças e disse: "Tomem isto e partilhem uns com os outros. Pois eu lhes digo que não beberei outra vez do fruto da videira até que venha o Reino de Deus". Tomando o pão, deu graças, partiu-o e o deu aos discípulos, dizendo: "Isto é o meu corpo dado em favor de vocês; façam isto em memória de mim". Da mesma forma, depois da ceia, tomou o cálice, dizendo: "Este cálice é a nova aliança no meu sangue, derramado em favor de vocês. (Lucas, 22:14-20)
A Última Ceia foi a antecipação do sacrifício da Cruz.
Nosso Senhor Jesus Cristo,
em seu misericordioso projeto de Salvação dos homens, se encarnou no meio de nós,
retrocedeu a eternidade e fez-se jovem, para morrer. Sendo inteiramente Deus e
inteiramente homem, Ele nunca falou de Sua morte sem mencionar, em seguida, a
Ressurreição.
Era necessário que houvesse um
Memorial de Sua Paixão. E assim o fez para não deixar à memória vacilante dos
homens. Foi por Ele instituído para lembrar a Sua morte e também porque voltaria a viver,
glorioso, de corpo e alma, depois da Ressurreição.
Aquela ceia teve um
caráter de despedida. Chegava o momento mais solene da vida do Ungido. Era a
Sua hora. Reunido com seus Apóstolos, disse: - Na verdade vos digo que não
tornarei a beber deste fruto da videira até que venha o reino de Deus.
Jesus, que veio realizar um
batismo de sangue, queria, ardentemente, comer a páscoa com seus discípulos. O novo e eterno pacto entre
Deus e o homem seria instituído naquela ocasião.
Iniciava, ali, um novo
período, diferente da antiga Aliança de Deus. Antes, o pacto era concluído com sacrifícios de sangue de animais. A primeira aliança, com Israel, por intermédio de
Moisés, foi prometida a libertação dos hebreus, o povo escolhido, da escravidão do Egito.
Depois, através de Abraão, com o direito a progenitura e, mais tarde, de Davi, com a
promessa do reinado.
Na véspera de Sua Paixão,
durante a Páscoa, o Filho de Deus mediou um Novo Testamento, com o próprio
sangue, derramado na Cruz. O verdadeiro Cordeiro Pascal que tira o pecado
do mundo.
Antevendo a Sua hora,
Jesus reuniu os doze Apóstolos que com ele caminhava há três anos, o
início de sua vida pública. Em um ato sublime, interpretou o significado de Sua
morte e declarou o início da Nova Aliança, que seria ratificada, na tarde do
dia seguinte, com Sua morte sacrificial e vicária na Cruz.
O sacrifício do Cordeiro imolado era necessário para que houvesse a nossa perfeita comunhão com Deus.
Durante a ceia, sabendo de seu destino como homem, deitou água em uma bacia e começou, como sinal de deferência e serviço, a lavar os pés dos discípulos, como prelúdio da paixão, e a secá-los com a toalha com que se cingira. Este gesto não reflete apenas a humildade, mas sim o ato salvador que Jesus fará para dar a vida ao mundo. O lava pés remete à Cruz. Os discípulos deveriam olhar também para o Calvário e imitar o gesto de amor de Nosso Senhor.
Onisciente, Jesus, o próprio Deus
encarnado, sabia, desde sempre, que seria traído. Naquele momento, o traidor
constituía uma das maiores preocupações do Mestre. Sempre foi dono e senhor dos acontecimentos. Tudo era feito e conduzido segundo a Sua vontade.
Trata-se de um dos episódios mais dramáticos do Evangelho. O sombrio contraste entre a ação de Nova Aliança e a ação do traidor à mesma mesa. Judas Iscariotes, descoberto e desmascarado, impelido por uma potência diabólica, saiu daquele Cenáculo. Mais tarde trocaria a informação privilegiada por 30 moedas de prata. A consumação da traição e a saída de Judas coincidem com a noite. Posteriormente, incrédulo e orgulhoso, sem arrependimento, pendurou-se em uma árvore para dar cabo à própria vida.
No momento solene daquela
ceia, Jesus institui a Eucaristia. O novo mandamento do Amor estava consagrado.
Toma o pão e, depois de o abençoar, parte-o e, com piedade, pronuncia as
palavras de esperança sublime, as que traziam para sempre a este mundo de
tristeza o banquete gozoso do Paraíso: Tomai e comei, isto é o meu corpo,
que é dado por vós. Após todos comerem o pão abençoado, faz a mesma coisa
com o cálice: Bebei todos deste cálice, pois este é o meu sangue, o sangue
da Nova Aliança, que será derramado por muitos em remissão dos pecados.
Os atos e palavras de Jesus antecipam e interpretam sua morte próxima. O que acontece com o pão, acontecerá ao corpo e o que acontece à taça de vinho acontecerá ao Seu sangue. Então, participar do pão e do vinho significa participar da morte de Jesus.
Estava
desfeita a lei dos símbolos, holocaustos e dos sacrifícios de animais, para
começar o tempo das realidades. Jesus acabava de instituir o sacrifício da nova
e eterna Aliança. A Antiga Aliança foi
redimensionada. Ele mesmo seria o sacrifício perfeito e suficiente, o
Cordeiro imolado pelos nossos pecados.
Não havia mais dúvida: Cristo
se revelou como o Filho de Deus, o Filho do Homem, o Cordeiro de Deus, o Pão da
Vida. Com Sua morte, instituiu o sacramento da Eucaristia. Comendo o Seu
sacratíssimo corpo e bebendo o Seu preciosíssimo Sangue, teremos a vida eterna.
Tudo o que Jesus preparou durante a sua vida, com palavras, atos, parábolas, explicações, usando símbolos e sinais do Antigo Testamento, todo o mistério foi finalmente revelado na Última Ceia, quando ele estabeleceu o rito da Nova Aliança e consumou a Sua missão messiânica neste mundo. Toda a vida de Jesus se orienta para esta hora final, o ponto culminante do Seu mistério.
O significado deste gesto
de amor sublime é impensável. Transbordando de amor e misericórdia, a Paixão na
Cruz seria pouco para Ele. Quis dar-se a cada um de nós de um modo
permanente. Quis converter-se em alimento real da humanidade esfomeada.
Deixava, assim, pela soberana vontade de Deus, um sacrifício perene e de valor
infinito, um banquete em que o amor se entregava de uma maneira substancial.
Escolheu ficar no mundo para alimento das almas sedentas.
A morte iminente, foi posta diante dos Apóstolos de forma simbólica e incruenta. Na Cruz, morreu pela separação do corpo e do sangue. Por isso, o pão e o vinho são consagrados separadamente, para anunciar a morte. Eucaristia, o Santíssimo sacramento e sacrifício, a partir da Cruz, ofertada, misericordiosamente, pelo próprio Autor da graça. O sacramento é celebrado ao ser feito o sacrifício. A comunhão é obrigatória para a perfectibilização do sacrifício.
Sublime o mandamento divino
para prolongar e perpetuar o Memorial de Sua morte: Fazei isto em memória de
mim (São Lucas 22,19). Significa renovai, por todos os séculos, até o fim
dos tempos, o sacrifício oferecido pelos pecados do mundo.
Após a dupla
consagração, Cristo deu aos Apóstolos, que irão transmiti-lo a todas as gerações
como fonte de vida, de graça e de perdão, o poder e a ordem para fazer o que
Ele tinha feito.
O Memorial, instituído pelo
próprio Cristo, cabeça santa da Igreja, que não poderia ser vencido pela morte, deveria rememorar a
todos os cristãos, até a consumação dos séculos, a Sua morte redentora na Cruz.
A ordem foi para relembrar e anunciar Sua morte até que voltasse! Os discípulos deveriam anunciar, no futuro e para sempre, o Memorial da Paixão, morte e
Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Quando a Igreja repetisse o
Memorial, Cristo, que, sob ação do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria e
padeceu sob Pôncio Pilatos, estaria glorificado nos céus.
Na Quinta-Feira Santa, o
Salvador apresentou aos Apóstolos o sacrifício sob as espécies de pão e do
vinho.
Na missa, há uma aplicação,
em um novo momento no tempo e uma nova presença no espaço, do único sacrifício
de Cristo, agora, glorificado. Em obediência a Seu mandamento, os discípulos
estariam representando, de forma não sangrenta, aquilo que Ele apresentou ao
Pai no sacrifício de sangue do Calvário.
Todo amor almeja unidade e
essa unidade, na ordem divina é a junção da alma e Cristo na comunhão.
Quando renovamos o Memorial
e comemos e bebemos o Corpo e o Sangue, o fazemos a partir de um Cristo
glorificado e ressuscitado, que continuamente intercede por nós, pecadores e
miseráveis.
A salvação da Cruz é assim
atualizada ao longo do tempo pelo Cristo celestial. Comer e beber a hóstia
consagrada equivale a Jesus fazer à alma do homem o que a comida e a bebida
fazem ao corpo.
Na Última Ceia Jesus deu
aos Apóstolos algo que, ao morrer, ninguém mais poderia oferecer: a Si mesmo, a
fim de consagrar a divina obra da Redenção. Não se trata, porém, de um fim
trágico de um homem ou de uma simples recordação que não volta mais, mas sim da
verdadeira salvação da humanidade.
Jesus queria que o mesmo drama do
Calvário fosse encenado não apenas uma vez, mas por todos os tempos. Os homens
não seriam apenas leitores da Obra de Redenção, mas parte e atores dela,
oferecendo seu corpo e seu sangue junto com o de Cristo na reencenação do
Calvário.
O cristão oferece ao Crucificado
também o seu corpo, o seu sangue, as suas angústias e misérias a fim de que,
morrendo para a natureza inferior, possamos viver para a graça divina. Ressuscitados
espiritualmente, pudéssemos participar de Sua glória eterna.
O Pão Vivo que, comido
sempre, nunca diminui, há de saciar a fome dos homens até o dia em que possam
estar com o Pai, face a face. Não é só uma recordação, mas uma presença real.
A liturgia que a Igreja
celebra é exatamente a ordem de renovação incruenta do santo sacrifício do
altar. Jesus não morre em todas as missas. Ele morreu uma única vez, que foi suficiente
para a remissão de todos os pecados. O efeito espiritual desta morte
perpetua-se por toda a eternidade, até o fim dos tempos. A ceia de Jesus com os discípulos antecipa o banquete
celeste do cordeiro, descrito no livro do Apocalipse.
O homem, sozinho, pecador, miserável e pequeno, não
conseguiria apagar os seus próprios pecados. Era incapaz de se redimir e
restabelecer a amizade com Deus pai, perdida com o pecado original. Foi necessário que o Cordeiro fosse imolado,
com todos os profundos sofrimentos, para nos garantir a vida eterna.
Mal o sacerdote pronuncia as palavras da
Última Ceia - isto é o meu corpo - o pão já não é pão. Pelo mistério da
transubstanciação, converteu-se na carne de Cristo.
Fazei isto em memória de
mim!
Estas palavras conferiram a sua eficácia sobrenatural e divina a todas as missas que
se haviam de celebrar no mundo, até o fim dos séculos.
Apesar do discurso de despedida, Jesus conforta os discípulos abatidos com a promessa do Consolador, que confirmará e fortalecerá a fé daqueles que serão perseguidos e martirizados. Pede que recordem a instrução recebida para a missão de pregar.
Através da Oração Sacerdotal, pronunciada no Cenáculo, traduz-se na oração eterna do Senhor glorificado. Na hora suprema da cruz, Jesus compre perfeitamente a obra do Pai, que foi revelado em Sua própria presença.
Somente com a força da Ressurreição, os efeitos espirituais da eucaristia e a vinda do Espírito Santo paráclito é que os Apóstolos tiveram firmeza, valentia e coragem para anunciar o Evangelho em todos os lugares, até os confins do mundo, batizando e anunciando o Reino de Deus.
No amor e na paz de Nosso Senhor Jesus Cristo!